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quinta-feira, 18 de agosto de 2011

O canto do Uirapuru


Uirapuru é uma ave que habita a floresta amazônica brasileira e tem seu nome vindo da língua tupi-guarani. De canto suave e delicado como uma flauta, dizem que quando o Uirapuru canta a floresta inteira silencia para ouvi-lo. O melodioso canto só é ouvido durante quinze dias do ano ao amanhecer e ao por do sol, enquanto o Uirapuru constrói seu ninho para atrair a fêmea.

Segundo a lenda, um índio muito disputado pelas jovens da tribo foi morto por seu rival, seu corpo desapareceu e ele se transformou na ave que habita a floresta, seu canto era ouvido pelas pessoas mas se afastava sempre que perseguido. Ao ouvir seu canto, homens e mulheres fazem-lhe pedidos na esperança de serem atendidos e ainda dizem que a ave traz sorte a quem a possui.

Calma, este ainda é um blog sobre carros, já é a segunda postagem seguida que venho falando sobre pássaros, primeiro o Carcará, agora Uirapuru, quem será o próximo? Sabiá? Talvez. Uirapuru foi o nome dado ao 4200 GT um cupê esportivo, um legítimo Gran Turismo projetado por Rigoberto Soler, um espanhol radicado no Brasil, fabricado pela Brasinca Ferramentas, Carrocerias e Veículos S.A. e posteriormente pela STV    Sociedade Técnica de Veículos    onde Soler era diretor.

De linhas modernas, e clara inspiração no design italiano da época, dizem até que a inglesa Jensen copiou descaradamente seu design para o Interceptor lançado dois anos depois do Uirapuru.
Jensen Interceptor
Feito com estudo em túnel de vento, tinha carroceria monobloco em chapa de aço feita a mão, traseira curta, vidro traseiro envolvente, portas com um corte no teto para facilitar a entrada, saída de ar logo após as rodas dianteiras, para refrigerar os freios a tambor, e frente longa para acomodar seu motor, um 4200 cm³ de caminhões leves da GM equipado com três carburadores ingleses SU H4 iguais os do Jaguar E Type, 155 cv que chegaram a 162 cv no final da produção, com distribuição total de peso do carro em torno de 50% para cada eixo, o 0-100 km/h em 10,4 s feito completamente em 1ª marcha, devido ao seu câmbio Clark de três marchas no assoalho e diferencial longo, a velocidade máxima era próxima a 200 km/h, números razoáveis para qualquer sedan médio de hoje, mas realmente esportivos para 1964.

Possuía acabamento refinado, com painel em jacarandá, volante de 3 raios da marca Walrod sem assistência hidráulica o que a tornava bem pesada, tinha ar condicionado que pouco esfriava, dois lugares.

Sua receita foi seguida por alguns esportivos americanos anos depois, pegue o maior motor que tiver e esprema-o em uma carroceria leve e pequena, neste caso, o motor era de caminhões Chevrolet C-1416, assim como Dodge Viper e Ford GT que tiveram motores vindos das caminhonetes Dodge Ram V10 e Ford F-150 Lightning respectivamente.

A idéia da Brasinca, que era fabricante de peças e ferramentas era ter um produto que pudesse ser identificado nas ruas, algo que pudesse se apontar o dedo e falar "olha lá, é um Brasinca", coisas que qualquer marca quer, ser conhecida.

Mas o investimento acabou saindo caro para a Brasinca que acabou deixando de fabricá-lo e a STV retomou sua produção em 1966 decidiram criar uma equipe de corridas para divulgar o carro, os 4200 GT SS de corrida, chegavam a mais de 230 km/h, o Uirapuru chegou a ter certo êxito nas competições, mas seu elevado custo o tornava inviável e sua produção foi encerrada em 1967, para nunca mais voltar.

No total, foram fabricados 73 cupês, 3 conversíveis e 1 um protótipo de um furgão construído para a polícia conhecido como Gavião, que era à prova de bala, possuía duas metralhadoras na grade frontal com acionamento interno e segundo uma publicação da época "radar".

Destes 77, acredita-se que pelo menos 40 estejam em bom estado, há notícias de um dos conversíveis em perfeito estado, um protótipo branco apresentado no Salão do Automóvel feito às pressas, sem luzes de sinalização lateral e com faróis retangulares, provavelmente vindos de algum modelo importado, já que a Brasinca não conseguiu a fabricação dos mesmos pelas auto-peças brasileiras e o Gavião está desaparecido, dizem que foi doado ao 1º Grupamento da Polícia Rodoviária do estado de São Paulo, utilizado por algum tempo e desaparecido, sem mais notícias, o que pode torná-lo um dos carros mais valiosos do Brasil se for encontrado.

A Brasinca seguiu fabricando durante muitos anos adaptações para caminhonetes em fibra de vidro, transformando-as em cabine-dupla e acredito que tenha fechado as portas nos anos 90 por causa da difícil concorrência com os modelos importados.

Pouco tempo atrás, surgiram alguns estudos sobre um restyling do Uirapuru, com desenhos e protótipos em escala muito bons, mas não tive mais notícias sobre eles ou sobre continuação do projeto.

Quanto às lendas sobre o Uirapuru, algumas parecem ser verdadeiras mesmo para o carro, acredito que naquela época, quem tentasse persegui-lo só ia ouvir o canto do forte motor Chevrolet se afastando, não como uma flauta, mas como um trovão e quem possui um Brasinca Uirapuru já é uma pessoa de sorte por tê-lo.





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